O PROCESSO DE LUTO



Luto pode ser definido como um conjunto de reações diante de uma perda, portanto algo a não ser desprezado, e sim, devidamente valorizado e acompanhado, como parte da saúde emocional. O luto é “afinal o acontecimento vital mais grave que a maior parte de nós pode experienciar” (Parkes, 1998, p. 44). Sua dor é tanto parte da vida quanto a alegria de viver; é talvez, o preço que pagamos pelo amor, o preço do compromisso” (Parkes, 1998, p. 22). Não obstante, cumpre considerar que o luto “não é um conjunto de sintomas que tem início após uma perda e, depois gradualmente se desvanece. Envolve uma sucessão de quadros clínicos que se mesclam e se substituem” (Parkes, 1998, p. 23). Podemos tomar como conceito bem adequado o de que “o luto é um processo de aperceber-se, de tornar real o fato da perda” (Parkes, 1998, p. 199).
Desde milênios vemos presentes os rituais, os quais sempre tiveram a finalidade de servir como uma forma de proteção no conflito vida x morte.
Podemos ver no luto vários simbolismos, um dos quais é a cor. Para algumas sociedades, o branco, o amarelo e o violeta caracterizam a fase; para outras, como a nossa, é o preto que facilita o reconhecimento da perda. Outro simbolismo clássico em nossa sociedade predominantemente católica é o ato religioso, mais comumente representado pela missa de corpo presente e a de sétimo dia.
O luto é a fase da expressão dos sentimentos decorrentes da perda, a qual se demonstra por choque, desejo, desorganização e organização; é a fase de aprender que a morte deve ser tornada real, a partir do que se torna possível estabelecer novas concepções sobre o mundo, favorecendo investimentos pessoais.
A fase do choque pode durar horas ou dias, constituindo-se de desespero, raiva, irritabilidade, amargura e isolamento. Tais sentimentos podem se manifestar por atitudes emocionais intensas e passam a ser expressos contra todo aquele que venha a compartilhar o luto, como uma manifestação de defesa, pois a aceitação desses sentimentos reafirma a perda.
A fase do desejo é caracterizada por um forte impulso de busca pela figura perdida. Nela ocorre um estado de vigília, de movimentação para os locais onde a pessoa normalmente estaria, e mesmo de chamamento, como formas de descaracterizar a perda, pois se ela é procurada, ela não morreu. Essa fase pode durar anos ou meses, sendo comuns os desapontamentos por sua não-efetividade, com
episódios de choro e de tristeza quando da constatação da sua inutilidade.
Nesta fase da busca e do desejo se misturam a desorganização e o desespero, pois esta perda traz consigo outras secundárias, cuja intensidade dependerá das características da personalidade e das experiências prévias do enlutado e do apoio recebido por parte da sociedade e da família.
A fase de reorganização, quando há reapropriação de parte da energia do investimento objetal ao ego, caracteriza-se pela aceitação da perda definitiva e pela conseqüente constatação de que uma nova vida precisa ser iniciada. No entanto, é possível ocorrer recidiva de episódios de saudade e de tristeza.
Uma forma de abrandar o luto é manter a sensação de que a pessoa está por perto e criar uma idealização através do reviver de lembranças felizes. Podem ser, neste caso, bem-vindos os tributos ao falecido, pois isto representa que este é merecedor da dor dos sobreviventes.
O luto, como não é um processo linear, não tem data para terminar, podendo durar meses e anos, ou mesmo nunca acabar, na dependência direta das características individuais da personalidade e ainda do nível e intensidade de relação que se manteve com o falecido.
Não há uma clara e estática definição para os tipos de luto. Normalmente ele é considerado patológico quando é por demais prolongado e apresenta características obsessivas.
No luto bem-elaborado, gradualmente tem-se o desinvestimento, da libido objetal e reapropriação da libido egóica, o que, no entanto, não ocorre na melancolia, pois o objeto não pode ser renunciado e o investimento objetal continua e pode até ser mais intenso, não permitindo então a retirada dessa energia para ser reapropriada ao ego. No luto mal-elaborado podem surgir os quadros melancólicos: enquanto o luto representa a perda real, a melancolia representa o inconsciente, relacionado ao objeto perdido, quando não se sabe verdadeiramente o que se perdeu.
O processo de luto mostra-se organizado e é conscientemente aceito quando a morte foi tomada como real e o enlutado apresenta disponibilidade para novos investimentos em sua vida, podendo assim manter vivos os sentimentos em relação ao falecido, a que se alia a recuperação da auto-estima e da valorização do ego. 


João Batista Alves de Oliveira* Ruth Gelehrter da Costa Lopes

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