Homens que choram
A
tristeza de Roberto Carlos expõe as dificuldades dos viúvos em superar o luto e
reconstruir a vida longe das mulheres que amam
A
emoção turvou-lhe a voz. Com cabelos mais grisalhos, olhos úmidos e semblante
abatido, Roberto Carlos estampava no rosto a dor causada pela perda da mulher,
Maria Rita, morta de câncer há quase um ano. “Tenho chorado muito, mas evito a
depressão”, disse no sábado 11, horas antes de pisar no palco do Estádio
Geraldão, no Recife. O show marcou a retomada da carreira depois de um longo
período de luto e recolhimento. “Estou fazendo o que Maria Rita, meu
‘bichinho’, quer que eu faça”, declarou. Entre aplausos, silêncios respeitosos
e lágrimas das fãs que lotaram o estádio, ele entoou uma canção inédita: ”Amor
sem Limite”, homenagem à mulher. “Essa é a música mais importante de minha
vida”, disse. “Descobri que o amor sem limite é a medida certa do amor.” No
fundo do palco, telões projetavam imagens de uma sorridente Maria Rita. Ao
tentar superar a viuvez, o Rei expõe o avesso de um drama íntimo, muitas vezes
abafado por conveniências sociais. Mescla o sentimento de perda com a saudade
que não passa e a impotência diante do fato consumado.
O
sofrimento é intenso e duradouro. A morte do parceiro conjugal é um dos
momentos de estresse mais intensos que um ser humano pode enfrentar. Abala mais
que divórcio, prisão ou morte de um parente próximo, segundo uma escala usada
como referência terapêutica, organizada pelos psicólogos americanos Thomas
Holmes e Richard Rahe. O baque da
viuvez parece ser mais devastador entre os homens que entre as
mulheres. “Não é que sintam mais. Como eles têm maior dificuldade em pedir
ajuda e mostrar os sentimentos, tornam o luto mais complicado”, explica a
psicóloga Maria Helena Bromberg, supervisora do Laboratório de Estudos e
Intervenções sobre o Luto da PUC de São Paulo. A convivência com a solidão também
é mais hostil na viuvez masculina. Homens vivem menos que as mulheres – no
Brasil, a diferença, em média, chega a sete anos. Portanto, foram culturalmente
preparados para deixar viúvas. Elas, em contrapartida, ao perder o parceiro,
encontram conforto mirando-se no exemplo de mães, avós e amigas que passaram
pela mesma situação.
“Contava
morrer antes dela, porque não acharia ninguém que melhor me ajudasse a morrer”,
disse o escritor Machado de Assis em 1904, quando perdeu Carolina, companheira
por 35 anos. Machado imortalizou a dor da viuvez num poema dedicado à mulher:
Trago-te
flores, restos arrancados
Da
terra que nos viu passar unidos
E
ora mortos nos deixa e separados.
“A
mulher sabe lidar melhor com essa separação imposta”, concorda o arquiteto
Fernando Coimbra Santos, de 53 anos, viúvo de Eliana, que morreu de câncer há
dez anos. A sogra o ajudou a organizar a casa e a educar as três filhas. Mesmo
assim, Santos teve de assumir tarefas que jamais fizera, como passar roupa e ir
à feira. Ele ainda mantém em casa objetos que comprou com a companheira.
Demorou seis anos para entabular um relacionamento sério. “Minha noiva é
maravilhosa, mas até ela diz que Eliana foi a mulher de minha vida.”
A
dificuldade do homem em enfrentar a viuvez também transparece nos problemas de
saúde. Estudos apontam que os viúvos apresentam mais sintomas físicos de
doenças e ficam deprimidos por mais tempo se comparados às viúvas e aos homens
da mesma idade que não perderam a esposa. “Eles não demonstram emoções e tendem
a somatizar o luto”, afirma a psicóloga Neli Klix Freitas, da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Durante cinco anos, Neli acompanhou
o primeiro ano de luto de 150 viúvos e 150 viúvas. Constatou que os homens
tinham três vezes mais problemas cardiovasculares.
O
trunfo para superar o luto, dizem os especialistas, é encarar a tristeza,
inclusive falando sobre a pessoa morta. Viúvo há dois anos, o ex-beatle Paul
McCartney assumiu recentemente uma aguerrida militância pelos direitos dos
animais. Até participa de passeatas para arrecadar fundos. A causa era
defendida pela mulher, Linda, que morreu de câncer. Ele a homenageou no CD A
Garland for Linda (Uma Grinalda para Linda). O luto durou até o início
deste ano, quando começou a namorar a modelo Heather Mills.
O
jurista Miguel Reale, de 90 anos, sentiu-se impelido a escrever sobre a mulher,
Filomena, com quem vivia desde a década de 30. Em 1998, perdeu a companheira e
fez para ela um soneto intitulado Eterna Juventude. Também escreveu um
artigo sobre amor e morte, publicado no ano passado pelo jornal O Estado de
S. Paulo. O texto arrebatado termina assim: Não mais porás teus olhos
nos meus olhos. Mas nos veremos pelo tempo afora pelos olhos do nosso eterno
amor.
Segundo
Maria Helena Bromberg, é comum os homens disfarçarem o sofrimento mergulhando
no trabalho. O engenheiro Michael Bauer, de 37 anos, garante que essa terapia o
ajudou a se recuperar da perda de Cornelia, com quem namorou por dez anos e
ficou casado durante um ano e meio. Ela morreu em 1996, na queda do Fokker 100
da TAM, perto do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. “Estava numa reunião na
fábrica quando me ligaram avisando do acidente. Eu sabia que ela estava no
vôo”, lembra. Foi golpeado pela dor ao chegar em casa e deparar, pela primeira vez,
com o armário repleto de roupas da mulher. “Mantenho contato com os pais dela
até hoje. Isso me ajuda a superar o trauma”, admite. Entre as 99 vítimas do
acidente, apenas seis mulheres deixaram viúvos. Todos já se casaram, inclusive
Bauer. Ele começou a sair mais com os amigos depois do acidente para não ter de
ficar em casa sozinho. Assim acabou conhecendo Márcia, a atual companheira.
O
advogado Pedro Sérgio Costa Lima, de 42 anos, acompanhou o desabafo do Rei na
volta aos palcos e identificou-se com a situação. “Roberto Carlos disse que a
fé não remove montanhas da forma como imaginava”, diz Lima, viúvo desde 1994.
“Quando tudo aconteceu, passei três dias deitado na cama me sentindo enganado
por Deus.” A mulher, Daisy, morreu aos 36 anos, vítima de câncer no seio. O
advogado desmoronou. “Chorava até quando não conseguia colocar o lixo na rua
antes de o caminhão passar”, recorda-se. Encontrou força para reerguer-se nas
filhas, Juliana e Keila, hoje adolescentes. Não se casou novamente. Reconhece
que só agora a viuvez começa a deixar de pautar sua vida afetiva. “Demorei a
perceber que não tive culpa pela morte de Daisy e, enfim, mereço continuar
vivo.”
Paula Pereira, com Sérgio Adeodato, do Recife, e
Cilene Guedes, do Rio
Gostei do texto, muito interessante essa matéria.
ResponderExcluirA vida continua e a fé nos sustenta.
Abraços, Fátima - MG
Oi Fatima...
ExcluirFico muito feliz com a sua visita ao nosso blog e o seu comentário tão carinhoso..
Volte sempre e muito grata..
Um fim de semana de muita LUZ...
Um forte abraço...
Olá querida Zelinda,
ResponderExcluirGostei muito do seu post e achei bem oportuna a abordagem sobre esse tema. Depoimentos sensíveis e muito interessantes, de homens que expressam seus sentimentos pela sua grande perda. Mas que, apesar da dor, souberam buscar uma luz, um novo caminho para recomeçar suas vidas.
Obrigada amiga, pelos lindos comentários que vc deixou no meu blog e pela energia positiva que me transmite através de tuas palavras e do teu imenso carinho.
Que Deus a abençoe sempre e ilumine os teus passos!
Um abraço carinhoso. Te amo.
OI amiga Ilca...
ExcluirEu também agradeço pela força e apoio com os sus comentários e pelas palavras carinhosas.
Eu achei que essa postagem vai ajudar os homens a percorrer um caminho mais livre e poder expressar seus sentimentos e aliviar sua alma e através do choro as perdas e as tristezas que a vida oferece.
A dor de cada um é a dor maior.
Foi muito gostoso o nosso bate papo por telefone me ajudou muito pois estava muito mal naquele dia.. o melhor remédio são os amigos e os ombros que eles nos oferecem...
Valeu amiga..
Bjjs.. Te amo..
Uma semana de muita LUZ...
Estou me recuperando devagar...
Obrigada André pelo seu comentário..
ResponderExcluirEstou colocando no nosso blog..
Amada Irmã Zelinda, a Paz.
Como sempre o Amor e a Sabedoria presentes em suas palavras.
E essas palavras são genuínas, pois sei que vêm do fundo do coração.
Um ótimo final de semana.
Seu admiradore Filho espiritual,
André