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Mostrando postagens de outubro, 2015

Enquanto eu viver

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por Ique Hoje sentei ao lado do meu pai. As mãos dele começaram a tremer. Ele pegou o ipad e escreveu: “Meu filho, estou com dificuldades para digitar. Não sei até quando vou conseguir. Então, vou escrever algumas coisas pra você nunca esquecer, tudo bem?” Respondi: “Tudo bem.” Ele começou a digitar. Quando terminou, com os olhos cheio dágua, entregou o Ipad. Comecei a ler: “Enquanto eu estiver vivo, não me deixe dormir até tarde. Estamos aqui por pouco tempo e, enquanto estou aqui, quero aproveitar. No café, não coloque adoçante. Eu gosto com açúcar, com afeto. Na hora de me dar banho, não precisa escutar Roberto Carlos. Pode colocar o vocalista cabeludo que você gosta. Não lembro o nome dele, “Eddie Vera?” Daqui 2 meses é meu aniversário. Me leve para ver o mar, pela última vez. Enquanto eu estiver vivo, toda sexta feira, traga rosas vermelhas e, entregue para a sua mãe. Antes de dormir, gosto de ver o Jornal. Qua

O amor que nos mantém vivos

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São 23:04h. Meu pai acaba de ser ligado a uma máquina de oxigênio. Eu perguntei ao médico o que estava acontecendo. Ele respondeu: “Seu pai está morrendo. É hora de você dizer adeus”. Eu perguntei: “Doutor, você já amou alguém?” Ele ficou em silêncio. Eu disse: “Quando você ama alguém é impossível dizer adeus. Porque dizer adeus significa desistir e esquecer”. Meu pai abriu os ohos e com muito esforço conseguiu dar meio sorriso. O médico olhou aquela cena e, com os olhos cheio d’agua, deixou escorrer uma lágrima. Eu pedi ao médico para ficar um tempo sozinho com meu pai. Ele disse: “Tudo bem. Vou esperar na sala”. Ele abriu a porta e antes dele sair eu disse: “Não diga adeus. E, sempre que possível, ame mais uma vez”. Ele voltou e me deu um abraço. Saiu do quarto e fechou a porta. Olhei para o meu pai ele estava suando frio, chorando e engasgando. Seguei a mão dele e ela estava gelada. Então, coloquei a mão dele no meu coraçã

Relato de Graziela Gilioli

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“A morte do meu filho me ensinou que a gente pode escolher de que jeito queremos viver: felizes ou tristes" por Graziela Gilioli Graziela Gilioli fala da dor de perder um filho (o caçula, aos 14 anos) e de como se recompôs e escolheu ser feliz apesar da dor. No emaranhado do nosso tempo, adquirimos o hábito de viver sem pensar muito sobre o começo e o fim das coisas, e muitas são as crenças sobre a origem, o fim, e as suas razões. Nascemos e morremos ao bel prazer do destino como se fôssemos reféns dos segredos da nossa existência. E assim, vivemos alienados da nossa sabedoria, esquecidos do que realmente importa na vida. Mas, afinal, o que é que importa? Desde sempre nossas indagações sobre o significado das coisas estão suspensas no ar, sem resposta, porque esta é uma condição essencialmente humana – viver com muitas perguntas não respondidas. Sem respostas começamos a pensar na eternidade. Por força da imaginação nossa mente é capaz de acreditar que viver

Carta de um pai que não internou o seu filho

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André e Geraldo em São Vicente (SP), em foto de Ernesto Rodrigues Fabiane leite Há cerca de uma semana, André, que tinha 47 anos, morreu vítima de um infarto do miocárdio fulminante, em casa, ao lado do pai. Compartilho com vocês, com autorização do autor, trechos da carta que Geraldo enviou a centenas de amigos e apoiadores:  Há exatamente sete dias, nesta mesma hora, André, meu filho querido, morreu. Tudo começou e terminou comigo. Muitos, sequer o conheciam. Outros, o conheceram, e outros, até o acampanharam e cuidaram dele. Estas pessoas ficaram, indelevelmente, imarcadas em nossa memória.  André nasceu duas vezes, uma, de Wilma, sua mãe, e a outra, de mim, quando o assumi, depois de retirá-lo de um hospital psiquiátrico. Portanto, sinto-me fiador de todo esse querer bem, que vocês todos têm demonstrado por ele.  Tive um privilégio, uma graça por viver junto dele essa experiência, absolutamente fantástica, nestes vinte e cinco anos, desde o dia em que o retirei d

Luto Parental: ser pais e não ter o filho

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Eduardo Carlos Tavares e Gláucia Rezende Tavares (*) O luto parental desafia a vaidade de se perpetuar por meio da descendência. Perde-se a referência de futuro e das possíveis projeções idealizadas nos filhos. Evidencia a fragilidade da vida, assim como a ausência de uma sequência lógica diante da terminalidade. A morte do filho gera mudanças em todo o sistema familiar, repercutindo na relação do casal, dos pais com os filhos vivos e entre os irmãos sobreviventes. Há possibilidade da família se desintegrar, mas também de coconstrução de novos arranjos familiares. Nosso desafio, há 17 anos, é aceitar e assimilar a morte de nossa filha caçula e prosseguir na vida, como casal; como pais de uma filha sobrevivente; como avós de uma neta de cinco anos, que está aprendendo a amar a tia invisível. Já escutamos inúmeras vezes, que superamos bem o luto. Esse trabalho não é de superação. A proposta é transformar separação em atitude vitalizada. Estímulo a aprendizados, sair da