trecho do livro O Perfume de Eliana

por Alice Lanalice

Tomando fôlego para começar


31 de janeiro de 2001. Faz hoje exatamente um ano que minha filha, Laninha, se foi. Prefiro dizer que ela se foi. Qualquer outra maneira de expressar esta tragédia  parece ser mais dolorosa ainda. Escolhi justamente esse dia para iniciar a escrita do livro.

Escrevo em memória de minha filha Eliana, que morreu em um acidente automobilístico, em Campinas (cidade do estado de São Paulo) e também para partilhar a angústia com aqueles que choram pela mesma dor.

Foi um ano de grande dor, muitas perguntas, raríssimas respostas e algumas certezas.

Não sei se esta é a melhor época para escrever sobre isto. Toda a emoção que ainda existe pode comprometer a real compreensão do momento. No entanto, se esperasse mais tempo, talvez não conseguisse dar voz aos sentimentos.

O que importa saber se essa é a melhor época? Não sei tantas coisas. Não consegui  entender essa morte e me conformar com o estrago que ela trouxe.

Precisei aceitar essa situação sem respostas.

Eliana, minha filha querida!

Só tive a noção exata de quanto a amava depois que você se foi...

Será que é assim mesmo? Será que o amor só se apresenta na sua grandeza depois que o perdemos? O que fazer com esse amor, se não posso expressá-lo mais? Cadê você? Já não a tenho para lhe dizer essas coisas.

Passei minha vida com os olhos secos e só olhei o mundo de fora, a distância, numa atividade sem fim. Agora que estão molhados, só vejo o mundo de dentro, recheado de sentimentos, tentando encontrar, a qualquer custo, o sentido da vida.

Há ainda mais um filho, mas minha menina se foi para sempre! Tive o privilégio de ter dois filhos especiais. Envaideço-me por isso. Porém, choro quando lembro de Laninha. Nada pode substituir sua perda.

Éramos quatro. Sempre quatro. Quatro tigelas de sopa, quatro canecas de leite, quatro pratos na mesa, quatro ovos de Páscoa, quatro pedaços de pizza...

Agora, um buraco constante. Em tudo o que faço, sinto a falta do “mais um”. Mesmo juntos, nunca mais seremos quatro!

Ela se foi e a família perdeu sua estrutura. Desequilibrou-se.

O vazio não está somente dentro de cada um, mas também entre nós.

Os passos dos pés estão intimidados, não encontram caminhos. Os sons das vozes têm timbres mais surdos, as frases estão emblemáticas e os suspiros, constantes. A música está calada. Os jornais não são abertos e as notícias lá de fora já não interessam mais. Tudo perdeu a importância. Perdemos os hábitos e o jeito que tínhamos.

Um segundo de acidente foi o bastante para destruir tudo o que foi construído e criar uma difícil eternidade.

Nascida no dia 20 de setembro de 1974, início da Primavera, ela morreu aos 25 anos de idade, em uma manhã de verão, no auge dos sonhos e das realizações. Eram sete horas da manhã. Sua vida se deteve serenamente. Soube que logo depois do acidente, já agonizava. Foi socorrida, mas não tinha mais vida quando chegou ao hospital. Desde então, fico me perguntando se sentiu muita dor na hora da morte. Revivo toda a cena, mesmo sem tê-la presenciado. Não consigo admitir que uma jovem saudável perca a vitalidade, a inteligência, a voz, o sorriso, o movimento em apenas alguns segundos.

Dolorosamente sepultamos o que restava: seu corpo.

contato: lanalice@uol.com.br

Comentários


  1. Oi Laise..
    Obrigada pelo teu carinho e essa visita no nosso blog, vou ler e aplicar em minha vida, estaremos em contato ..
    Aonde vc mora?
    Adorei seu comentário, visite nossa página no face okk

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  2. Oi Zelinda,qta saudade!!!

    Tenho feito uma reflexão da minha vida e confesso ainda ando uma tanto quanto perdida.
    As vezes pareço estar bem,sinto até que voltando ao mundo real.Mas percebo que o real me assusta,me amedronta estar nele e então volto ao imaginário,parece loucura eu bem sei mas é assim exatamente como me sinto ,quatro anos da partida do meu filho amado...
    O relato que li acima me emociona,como pode pessoas que nunca se viram ter a mesma linha de pensamento.Simples porém dolorido demais pois todas as mães que vivenciam tamanha perda dentro de si guarda uma enorme e incurável dor.Não importa a idade do seu filho,se nasceu ou o quanto viveu,você o concebeu e isso basta ele já vive dentro de você e isso basta.O coração bate e você já o ama e promete dar sua vida pra que ele viva a dele...
    E vem então a tragedia e muda toda sua história.E você se vê obrigada a ser forte,a ser corajosa e seguir seu curso.Ouve de todos e de uma forma um tanto quanto assustadora que cada um tem seu ciclo e aquele trágico acidente o qual vitimou e arrancou avida do seu filho...Ah fazia sim parte do ciclo do seu filho. Muitos comentários deveriam serem pensados e repensados pra expor a uma mãe é o que eu acho.
    E assim que me sinto nesse momento revoltada com a vida e o que ela me apresentou.Mas vou levando do meu jeito mas vou caminhando...
    Um enorme abraço de quem tem muito carinho por sua pessoa.!!

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  3. Queridas amigas, me faz muito bem passar por aqui, é como eu não estivesse sozinha com a minha dor da saudade imensurável que eu sinto da minha filha que partiu quase 11 meses, ah!! Esses meses de Abril, Maio e Junho me trazem muitas lembranças, é como estar vivendo tudo de novo, cheguei até aqui pela força que Deus tem me dado, tentando ser cada dia mais forte, confesso que em muitos momentos dos meus dias tenho que encenar o roteiro da palavra ""tá tudo bem"" quando na verdade nada mais estará bem, nada mais será como antes, e ainda ter que ouvir que "foi melhor", eu também muitas vezes me sinto só e assim mesmo vou caminhando, com o coração faltando um pedaço, buscando as respostas que somente Deus está dando aos poucos, e na minha limitação nos meus pensamentos e na qualiade de mãe completamente apaixonada eu nunca vou entender a ausência de um filho ... Abraços !!!

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