Superação pela solidariedade


CIDADANIA
Projetos criados com base em tragédias familiares mostram que ajudar quem precisa pode amenizar as dores do luto


Débora Weber tinha 22 anos quando sofreu um acidente de carro na BR-116 no limite entre os municípios de Mandirituba e Fazenda Rio Grande e morreu, no Dia das Mães do ano passado. A família, que administra um centro de formação de condutores no primeiro município, nunca descobriu o que realmente provocou a colisão, mas sabia que não queria enfrentar a dor da perda em silêncio. Da manifestação por segurança na rodovia surgiu a vontade de criar um projeto maior, que combatesse todas as formas de morte trágica, e o desejo de ajudar os moradores carentes da região. Em agosto do ano passado, a família organizou o primeiro Dia da Esperança, com serviços gratuitos de recreação, cidadania e bem-estar. O evento recebeu 2,5 mil pessoas e contou com 400 voluntários.
Assim como a iniciativa dos parentes de Débora, outros projetos surgiram como superação de uma dor ou trauma. A forma de reagir ao trágico e ines­perado mos­­tra que é dos momentos de maior fragilidade que podem surgir as manifestações de solidariedade.

A mãe da estudante, a empresária Rosilene Weber, de 45 anos, é instrutora teórica na autoescola da família e conta que ainda não consegue entrar numa sala para falar sobre direção defensiva. Mas os dias de Rosilene não são menos agitados por causa disso. Logo após a morte da filha, que estava no último ano de Engenharia Florestal na Universidade Federal do Paraná (UFPR), um casal faleceu na mesma rodovia, na ponte sobre o Rio Iguaçu. Rosilene e sua família organizaram então um protesto no local, com a participação de aproximadamente mil pessoas.
Como já fazia palestras educativas sobre trânsito em Mandirituba, a família Weber resolveu ampliar o foco de atuação. Passaram a buscar combater não apenas as imprudências ao volante, mas todos os tipos de morte violenta, por meio do Movimento Grito pela Vida. Uma das principais ações do grupo, que congrega outras famílias de vítimas, é justamente o Dia da Esperança. “A Débora não suportava injustiça, comprava briga com quem agredia idosos, crianças. A própria inspiração desse dia veio dela e resolvemos fazer perto do seu aniversário, dia 27 de agosto”, diz a mãe.
Outro exemplo
Quem também encontrou seu lado solidário após passar por uma situação difícil foi Zelinda de Bona, 75 anos, uma comerciante aposentada que hoje coordena o Grupo Amigos Solidários na Dor do Luto. Em 1994 Zelinda perdeu seu neto Saulo, com 14 anos, vítima de um acidente de trânsito. A necessidade de dar apoio à filha foi mais importante que sua dor e serviu como principal incentivo para superar a tristeza. “Você tem duas opções para sua vida quando falece um ente querido: ou você é uma vítima ou um sobrevivente”, diz.
Cinco anos após a morte de Saulo, Zelinda foi para o grupo dos Amigos Solidários. Ligado à UFPR, o projeto oferece apoio a pessoas em luto por meio de terapias em grupo. “Sempre trabalhei com voluntariado, mas nada foi tão gratificante quanto estar à frente desse grupo. Faz 5 anos que estou na direção e acho que não estaria mais aqui se não fosse por isso”, afirma.
Iniciativas dão novo sentido à vida
Embora associado apenas à morte, o luto, segundo o psicólogo e psicoterapeuta Dionisio Banaszewski, se refere a uma elaboração sobre diversas perdas. Um divórcio, uma demissão ou até o rebaixamento do time do coração podem ser considerados lutos, pois proporcionam sentimentos de tristeza, impotência, raiva e insegurança. “Na nossa cultura não somos preparados para a morte, só para a vida, por isso temos dificuldades enormes de lidar com esse tipo de perda”, explica.
A psicóloga clínica Cris­tiane Verbiski de An­drade completa: “Quando perdemos um ente querido, iniciamos um processo de questionamento a respeito do sentido da vida. Nesse momento, alguns se fecham no seu sofrimento, no seu luto; outros procuram retomar de alguma forma o sentido da existência.”
Dentro dessa busca por uma motivação para viver é que surgem trabalhos como o de Rosilene Weber e Zelinda de Bona. “A pessoa passa a se sentir capaz de novo. A partir do momento em que ela pode fazer algo pelo outro, isso é prazeroso, e não só para quem sofreu uma perda dessas. As coisas passam a fazer sentido e muda o olhar sobre a vida”, explica o também psicólogo e psicoterapeuta Tonio Luna.
Segundo Cristiane, olhar para o sofrimento alheio ameniza a dor e faz com que as pessoas percebam que não são as únicas enlutadas. “Quando conseguimos intervir de alguma forma no sentimento do outro, podemos compartilhar essa retomada pela vida. Passamos a entender que a morte é mais uma etapa da existência.”

Amigos Solidários
O Grupo Amigos Solidários na Dor do Luto se reúne todas as segundas-feiras, das 14h30 às 17 horas, no prédio histórico da UFPR (sala 118, Departamento de Psicologia). Mais informações: 9113-4262, 3252 5016 ou pelo e-mail: zelindadebona@hotmail.com

Evento
2.º Dia da Esperança será em 25 de agosto
O 2º Dia da Esperança está agendado para o dia 25 de agosto no Parque Municipal Ângelo Zeglin Palú, em Mandirituba, das 10 às 17 horas. Com o intuito de despertar o voluntariado em quem perdeu um ente querido e oferecer serviços gratuitos a comunidades carentes, a expectativa é atender cerca de 5 mil pessoas neste ano.
Haverá ações de saúde (com cálculo do peso ideal, orientações de exercícios físicos, realização de eletrocardiograma e coleta do preventivo do câncer uterino), de cidadania (com orientação jurídica, consulta sobre situação do CPF e de pontos e multas na carteira de habilitação), cultura e lazer (com brinquedos e oficinas para as crianças) e beleza (corte de cabelo, hidratação facial e maquiagem).
As pessoas que quiserem trabalhar como voluntárias podem entrar em contato pelo e-mailgritopelavida@yahoo.com.br ou pelo 9992-0904.

Gazeta do Povo 16.08.12 caderno Vida e Cidadania 

Comentários

  1. Minha cara amiga. tenho lido com bastante atenção Solidarios Amigos do
    Luto e tenho me encantado com o trabalho maravilhoso que estão fazendo.
    A nossa vida vale pelo amor que depositamos no próximo que sofre. E esse
    sofrimento não é somente material mas principalmente "aquela' dor de dentro
    coração e da mente cujo o remédio somente Deus pode dar.A oração é a maior
    colaboração de um amigo.A união e o amor de amigos reparte um pouco a
    angustia de quem sofre a perda de um ente querido.
    Com um carinhoso abraço da Zely

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  2. Minha querida Zelinda,
    Muito útil e de grande valor o conteúdo dessa tua postagem! Achei excelente!
    A solidariedade é, sem dúvida, muito importante e deveria ser praticada por todos, levando seu apoio e carinho para quem necessita. E realmente nos ajuda muito, especialmente quando estamos mais fragilizados, passando por momentos difíceis... fazer o bem ao próximo, se doar, dividir, compartilhar, nos traz felicidade. Posso falar por experiência própria, pois desde que a minha filha partiu, faço um trabalho voluntário levando uma palavra de amor, de conforto e de fé para as pessoas hospitalizadas e para os idosos em asilos. Nunca havia comentado antes porque não vem ao caso, o motivo maior desta minha decisão foi porque a Thais era voluntária há algum tempo, e sempre quis muito que eu também participasse do trabalho de voluntariado, eu costumava falar a ela "um dia eu vou, filha", portanto, agora era o momento.
    E com toda a certeza, nesse trabalho, somos os maiores beneficiados, toda a palavra é pouco para descrever o quanto me sinto gratificada... é dando que receberemos, esta é a grande verdade!
    Solidariedade, é a forma mais linda de amar!!!

    Minha querida, quero muito agradecer por tua presença tão carinhosa e amiga em meu blog, me emociono com tuas lindas palavras.
    Desejo que vc tenha uma semana feliz e abençoada por Deus!!
    Um abraço apertado com muito carinho.

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