De mãos dadas

Cultivar a união entre as pessoas e a confiança no outro pode ser a chave para um amanhã melhor para todos.



PORLucas Tauil Freitas

Edição 139 Vida Simples

Desde que aportamos na Nova Zelândia, há um ano, não consigo desviar minha atenção das diferenças que separam essa ilha no Pacífico Sul do nosso Brasil. Durante a primeira semana aqui, depois de dois anos velejando por ilhas remotas e sem disponibilidade de peças de reposição, entrei em uma loja náutica com uma lista de equipamentos quebrados do Santa Paz, nosso veleiro.

Tirei a carteira para pagar a conta salgada, mas o vendedor me explicou que os pagamentos eram faturados apenas no fim do mês. Perguntei quais documentos ele precisava para o cadastro. Então ele me acompanhou até a porta e disse: "seu nome é Lucas, não? A gente confia em você".

Inabitada até o século 13, Aotearoa, como a chamam os nativos Maori, é uma nação mais jovem do que a nossa. A população polinésia rechaçou o primeiro europeu que esteve por aqui em 1642, o holandês Abel Tasman, e floresceu até a chegada de James Cook, em 1769. Apenas uma centena de nativos sobreviveu à colonização inglesa no século 19, mas a cultura polinésia reacendeu, e hoje 14% da população é Maori.

O fato é que não apenas os Maori, mas a grande maioria da população vive com dignidade. As instituições funcionam e o salário mínimo é de cerca de R$ 4 mil e a remuneração média, da ordem de R$ 6 mil.

Diversos fatores apontam a origem da diferença, como seu tamanho pouco maior que o Estado de São Paulo e menos populoso. A Nova Zelândia também se beneficia do vínculo com a coroa britânica e se insere no mercado de países de língua inglesa que comandam a economia mundial. Não há dúvida de que todas essas questões são determinantes, mas há dois traços culturais que me saltam aos olhos no país: a confiança e a proatividade da comunidade.

Desde que chegamos, a escola das crianças organizou quatro mutirões. Cada um com mais de cem pessoas de pá e enxada na mão. Há dois meses, achamos uma carta carinhosa em nossa caixa de correio. Nossos vizinhos nos convidavam a participar de um piquenique em um terreno desapropriado para virar uma praça. Os moradores se organizavam para plantar árvores. Ninguém esperava que o governo realizasse a obra. Esse tecido social sadio é uma inspiração e me faz pensar sobre o mote no Brasil: a esperança é a última que morre!

Sonho com a confiança e a ação dando as mãos à esperança, com nossa gente tomando para si a responsabilidade de florescer esta nossa terra. Brasil que guarda minha raízes.

Lucas Tauil de Freitas veleja com a família desde 2013 e está na Nova Zelândia reformando o barco.

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