Uma etiqueta para o luto


Fonte : Revista Seleções
Data : Agosto de 1998
Autora : Crystal Gromer

Ajudar pessoas que sofreram uma perda não é fácil. Eis o que você precisa saber.
Em uma quente noite de julho, há vinte anos, meu marido Mark, com 24 anos, morreu. Inteligente e espirituoso, tinha cabelos castanhos que vivia puxando da testa. Ele me amava, disso não tenho a menor dúvida. Em todas as fotos que possuo de Mark, ele olha como se tivesse acabado de dizer algo engraçado. Estávamos casados havia nove meses e meio.
Num instante, registrado no atestado de óbito, eu perdera meu mundo. Não estava preparada, como ninguém pode estar. O luto não é uma viagem para a qual nos preparamos. É um momento extremamente solitário.
“Que posso fazer?”, perguntavam-se as pessoas. “Obrigada”, replicava eu, sem saber o que dizer e tentando tranqüiliza-las. A verdade é que não podemos fazer o que desejaríamos: trazer a pessoa de volta à vida.
“O que posso fazer?”, perguntei recentemente quando, de repente, o telefone tocou e eu soube da morte de um amigo. Telefono ou escrevo? Faço uma visita? Envio flores? Alimentos? O que eu digo?
Como essas perguntas me vieram logo à mente, passei bom tempo pensando nelas. Descobri que há uma etiqueta para o luto. Não é tanto série de regras quanto maneira de ser; requer que se dê espaço para a tristeza, para algo que não tem remédio. Em conseqüência, vai de encontro a suposições culturais que devemos esquecer.
Tendemos a pensar que sempre podemos recomeçar. Consideramos o luto como condição, algo a ser tratado tranqüilamente, nos bastidores, no consultório de alguém, 50 minutos por semana, com remédios. É como se nosso modelo para o luto fosse um tratamento de canal. Primeiro é terrível, depois melhora, finalmente acaba. Ultrapassados os estágios necessários, todos podem respirar aliviados. Quando o cônjuge se casa novamente, ou o casal tem outro filho, sabemos que a tristeza passou. Isso pode ser resolvido em um filme de TV.
Essa necessidade paliativa é difícil de reprimir. Quaremos ajudar. “Você precisa sair”, dizemos. “Ir ao cinema, almoçar com um amigo, comprar algumas roupas novas.” Seria mais útil oferecer solidariedade. “Você gostaria de...?”, em vez de: “Você deveria...”
No contexto do luto, o lugar-comum é simplesmente de mau gosto. “O tempo cura todas as feridas”, um amigo repetia para mim recentemente no funeral de outro amigo. Mas se realmente pensássemos a respeito da palavra curar, saberíamos como é terrível esse processo, como é doloroso e incerto. Se dois anos após um acidente com patins meu polegar esquerdo ainda não recuperou sua mobilidade, o que dizer do estado de minha alma depois da morte de um amigo, de meu marido?
Tentamos minimizar o pesar. “Pelo menos ele não sofreu”, dizem as pessoas. “Pelo menos ele não se tornou um vegetal.” A toda a hora você ouve um “pelo menos” sair da boca de um conhecido. Pare! Criar uma possibilidade imaginária pior não torna a realidade melhor. Isso a banaliza. “Pelo menos você é jovem”, as pessoas me dizem. “Pelo menos você tem a vida pela frente.” Como? Então isso não conta? Ouvir que tenho a vida pela frente só serve para lembrar que vou ter de me esgotar talvez durante 50 anos sem Mark. Os outros precisam tomar consciência da importância do luto e deixa-lo seguir seu curso, e não tentar faze-lo desaparecer.
O tom é importante. Devemos evitar a depreciação, mas também a reverência. Depois da morte de Mark, tinha a impressão de que as pessoas me olhavam como se eu fosse uma trágica heroína. Elas tendiam a olhar para as mãos quando conversavam comigo, as vozes se tornavam suaves para mostrar que compreendiam. No entanto, pareciam estar falando apenas para a imagem que tinham de mim. Eu me sentia solitária, um ser que ninguém queria conhecer.
Uma etiqueta para o luto deveria nos dizer o que fazer. Deveríamos ir a um funeral para engrossar as fileiras, para nos tornarmos membros de uma comunidade que lastima a perda de uma pessoa insubstituível. Podemos proteger as chamadas telefônicas de modo que as pessoas não tenham desculpa – “Eu não queria perturba-la” – para não ligar. Podemos aceitar flores, alimentos. Podemos dirigir, procurar carta, criar e apresentar uma estrutura da qual o dia ou a noite possa emergir.
Você deve escrever mensagem e não simplesmente assinar um cartão de saudações. Jamais comece “As palavras não podem expressar...” Você está se servindo de palavras, portanto não as use para expressar um vago sentimento de tristeza. Escreva sobre uma lembrança da pessoa que morreu, tão clara e exatamente quanto possa. Você pode dar isso como presente, uma foto de palavras. Nunca é tarde demais, portanto não se desculpe dizendo que já se passou um mês ou mais. Escreva de qualquer modo.
Numa reunião de minha faculdade, certa mulher que conheceu Mark na escola se aproximou para conversar – apenas um minuto ou dois – sobre suas recordações a respeito dele. Ouvir as lembranças de 17 anos antes foi maravilhoso, pois às vezes penso que Mark é apenas uma fantasia. Pergunto-me se ele realmente existiu. Não consigo mais me lembrar do som de sua voz ou do contato de sua mão.
Muitas vezes evitamos dizer algo significativo porque tememos que isso possa magoar. É claro que magoa! Mas a dor não é pior. Constrangimento também não, e isso deve servir de lição para os que gostariam de ajudar. A fuga é pior. O esquecimento é pior.
Dar e receber consolo são as atividades mais profundamente humanas. Uma etiqueta para o luto deve ajudar-nos a viver com o que é difícil – e compartilhar o que é sincero.

Comentários

  1. É, parece mesmo que o luto segue um certo "padrão", as pessoas vem até a gente, tentam consolar, dizem o que devemos ou não fazer, e depois parece que tudo "volta ao normal", cada um segue sua vida e a pessoa enlutada se sente muito só. Ainda bem que existem pessoas que se solidarizam realmente com a dor dos outros, como vocês da Amigos Solidários na Dor do Luto. e unidas vamos tentando ajudar umas às outras e assim nos tornamos mais fortes.
    Beijos, e fique com Deus!

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  2. Não me imagino daqui à 20 anos sem a minha filha Ana Cláudia, vivo como os A.As., um dia de cada vez. Já se passaram 04 anos e 02 meses e para mim parece que tudo aconteceu ontem. Me desculpe quanto ao texto acima, marido é substituível mas um filho(a) é insubstituível. Ele(a) sairam de dentro de nós, parte da nossa carne, do nosso sangue, da nossa alma. Infelizmente só quem passa pela dor da perda de uma pessoa é que tem noção da profundidade e da mistura de sentimentos que se confundem e afloram. Aprendemos com o passar do tempo a lidar e a nos comunicarmos com as outras pessoas que estão vivenciando a perda, mas acredito que seja impossível criar uma cartilha ou um livro de etiquetas para lidar e vivências o luto, pois, como sabemos a dor que você vivência é a maior do mundo e não existe um comparativo de pessoa para pessoa. O que existe é uma igualdade de atitudes e sensações que vivenciamos com a perda de nossos amores.
    Um abraço.

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  3. Liane,
    Esta postagem se refere a qualquer tipo de luto, seja de um amigo, marido ou filho. SEi que a perda de um filho não se iguala a outro tipo, mas para quem perdeu quem quer que seja, a dor é tamanha também...
    Sei que o grupo é formado em sua maioria de ma˜ezinhas especiais, mas devemos lembrar, respeitar e confortar a qualquer tipo de perda e sofrimento.
    um abraço forte,

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  4. Me desculpe, talvez não me fiz entender. O que ví nesse texto é que deveria haver uma cartilha de etiqueta que teríamos que seguir, e isso não existe. Nossas atitudes e reações são contraditórias a tudo o que achávamos correto e ético. Quero dizer ficamos ensandecidas, enlouquecidas diante da perda.
    E que a autora em alguns momentos entra em contradição, horas ela diz que é um momento extremamente solitário e que não podemos trazer a pessoa de volta à vida e que se dê espaço para a tristeza e que os outros precisam tomar consciência da importância do luto e deixá-lo seguir seu curso, e não tentar fazê-lo desaparecer. E em seguida nos fala que deveria existir uma etiqueta para o luto nos dizendo o que fazer. E mais acima após os estágios necessários ultrapassados todos podem respirar aliviados como que a tristeza e a perda já tivessem passado. Mais uma vez me desculpe vou reler o texto e tentar me colocar no contexto mais uma vez.
    Um Abraço.

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  5. Liane,
    não tem que se desculpar de nada, querida. EStamos aqui para compartilhar sentimentos e esse espaço foi criado para isso mesmo...
    um bjo gde,

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  6. Liane querida:
    Cheguei ontem de Foz do Iguaçu vi teu comentário, a dor de cada um é a sua dor maior não existe um termômetro para medir mas eu tenho certeza que é a maior.
    Acho que não existe ex pai e mãe, ex filhos e nem ex avós e sim ex esposa, esposo vc escolhe mais os do teu sangue são presentes de Deus nas nossas vidas ,sim existe outro tipo de amor muito maior.
    Nós estamos procurando fazer o melhor muitas vezes o que é para mim não é para os outros, Graças á Deus tudo isso é para o nosso crescimento e aprendizado.
    Não se preocupe querida eu te entendi e acho que vc está certa não existe amor maior do que de MÃE ,sempre aprendo muito escutando e lendo o que escreve e estando do teu lado quando estamos juntas.
    Te amo bjs

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  7. Amiga ZeLinda....quanta felicidade ver vc falar no programa.
    Mais uma vez agradeço a DEUS por você SER essa pessoa maravilhosa e sábia em suas palavras.Amo-te!
    Bj Serei eternamente grata por tudo o que me ensinas.
    Fica na paz!

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  8. Ola, gente li esse texto no intuito de poder entender o lado de uma amiga que está em.luto, eu gostaria tanto de tirar essa dor que ela está sentindo com as mãos... Pois foi muito triste a morte de seu esposo... Eu gostaria de mandar flores para ela, em forma de solidariedade, porque não sei como me aproximar.. Sabe tenho medo de falar besteira... Até porque nada e nenhuma palavra vai mudar o sentimento. Mas o que vocês acham.... Obrigada amei o post...

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  9. Ola, gente li esse texto no intuito de poder entender o lado de uma amiga que está em.luto, eu gostaria tanto de tirar essa dor que ela está sentindo com as mãos... Pois foi muito triste a morte de seu esposo... Eu gostaria de mandar flores para ela, em forma de solidariedade, porque não sei como me aproximar.. Sabe tenho medo de falar besteira... Até porque nada e nenhuma palavra vai mudar o sentimento. Mas o que vocês acham.... Obrigada amei o post...

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